18 outubro 2009

Nosce te ipsum

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"Nosce te ipsum." Tradução: "Conhece-te a ti próprio."

Como delimitar os graus de conhecimento, como definir o nível de profundidade de conhecimento sobre algo, sobre um assunto?

Quando trata-se de uma técnica, um procedimento de execução, algo concreto, é mais fácil definir, pois o resultado, o produto final em evidência é passível de avaliação. Mas quanto é uma informação, algo abstrato, cujo resultado final é alcançado por um comentário, uma explanação, justificativas para um posicionamento, a coisa complica...

Partindo do princípio que um saber não esgota-se, como posso posicionar-me categoricamente sobre um ponto de vista, alicerçado nos meus saberes atuais, se daqui um tempo - podem ser meses, ou anos - novas informações estarão adicionadas, e ampliarão a visão?

Seria uma prepotência, apenas com as informações sabidas atualmente, definir uma opinião, empacotando as informações e os argumentos, restringindo a visão apenas àquilo que meu conhecimento alcança no presente momento, apenas à maneira com que leio e interpreto o mundo hoje.

No entanto, decisões devem ser tomadas, escolhas devem ser feitas, e estas acontecem mediante avaliação pessoal, filtrada pelos saberes atuais - também pessoal.

Entendo que um posicionamento de observação do mundo e de si próprio, flexível à condição de mudança, possibilita espaço e humildade para alargar os horizontes do saber. Estar aberto à possibilidade de mudança de opinião, aceitar novas linhas de raciocínio, abraçar conceitos diferentes, colaboram para a expansão de visão de mundo, liberta a mente para crescer...

15 outubro 2009

Mérito Possuir

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Sempre me impressiona uma casa de dispõe de vasta biblioteca. Tanto conhecimento arquivado nas prateleiras, estacionado nos armários, acessíveis apenas à um círculo muito restrito de pessoas. O mesmo procede com uma discoteca (CD-teca?), videoteca (DVD), ou qualquer forma física de armazenamento dos produtos do conhecimento humano.

Reflexo da sublime felicidade do TER, aquele livro raro, caro, ou ambos; aqueles álbuns preciosos, músicas à muito tempo esquecidas, mas que nunca perdem a qualidade; a filmografia completa de um diretor específico, de um ator pontual, de um gênero singular.

Livros já lidos, que esporadicamente são consultados. Revistas ultrapassadas, epitáfios recentes. Músicas ocasionalmente tocadas, filmes só são re-vistos em ocasiões exclusivas, eventualmente, emprestados.

Qual mérito maior do que expor, explicitar a todos que por aqui passam, as peças que constituem o baluarte do gosto pessoal abarcado, da postura ideológica assumida, do ostentar um conhecimento arduamente labutado, refletido, absorvido, garimpado, lapidado e finalmente assumido (assimilado)?
Construção de reflexo moldado, exalar minuciosamente calculado... orgulho, vaidade, arrogância e soberba.

Em época de acessibilidade remota e compartilhamento universal, nada mais democrático do que dispor acervo tão precioso a quem interessar possa - não há roubo, não há perda, não há subtração. A mágica do digital está em duplicar infinitamente, sem prejuízo ao original.

12 outubro 2009

A egrégora da solidão

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Do grego egrégoroi, costuma-se definir egrégora como a somatória das intenções individuais, a força acumulada de vários indivíduos, todas aprumadas a um objetivo comum. Quando mais forte for a intenção dos indivíduos, maior será a egrégora gerada.

Quando há, por exemplo, um jogo de futebol, todos os torcedores de um time constróem uma egrégora, que disputa com a da torcida do outro time.
Esta egrégora criada proporciona a sensação de poder aos indivíduos, que conseguem tomar decisões que não seriam feitas se estivesse sozinho.
Imerso no coletivo, oculto no anonimato, fortalecido pelo respaldo dos aliados, não teme a responsabilidade exclusiva pelos atos e, enebriado, deixa-se levar pela tendência de comportamento da maioria.

Quando consciente desta capacidade de intenção do coletivo, o asceta consegue alinhar-se à egrégora já estabelecida, e dela obter força de vontade e a determinação necessárias para cumprir os objetivos almejados, consegue superar a resistência do ego, alçando a horizontes superiores aos que, sozinho, chegaria.

É nativo da espécie humana agrupar-se com os que compartilham afinidades, seja por motivos de sobrevivência, seja por questões ideológicas, culturais, sociais, espirituais, ou outras. Deste padrão derivaram as mais diversas culturas, as tribos, as civilizações.

No entanto, as circunstâncias comportamentais da atual socidade global fragmentam e isolam as intenções, privilegiam a exclusiva vontade individual, eudemônica, é cada vez mais valorizada a "autenticidade", como ferramenta de posicionamento em um mundo hedonista, inquestionavelmente estabelecido.

O cidadão, isolado, busca apoio no círculo afetivo mais próximo, mas confronta-se com seus semelhantes também acometidos pelas mesmas patologias. Integra o paradoxal grupo dos solitários, cegos guiando outros cegos. Encontra sua essência em uma espiral de angústia e solidão, onde o alívio só é alcançado na satisfação efêmera dos desejos que, uma vez atendidos, desvanece-se, retornando ao tormento inicial.

Está sendo construída - e consumida - a aldeia global, refletida em um espelho estilhaçado.

06 outubro 2009

Re-Conhecimento

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Certa vez me disseram que apenas conseguimos enxergar os defeitos dos outros, porque os reconhecemos - significando que também os temos.

Dentro deste raciocínio, todo e qualquer apontamento que levanto neste blog, sobre o comportamento humano, seus traços, qualidades e deficiências, apenas os visualizo, porque ainda habitam também em meu ser.

Ao meu ver, faz sentido.

Um Dândi, um Lama, um Buda, um Avatar, ou qualquer outro ser, cujos adjetivos o identifiquem já ter alcançado um tal estado de iluminação da consciência, certamente não vê, nas pessoas, defeitos, pois entende que são apenas traços, ou vestígios da personalidade ainda não lapidada, manifestações dos desejos do ego.
Entende que o próximo também compartilha o caminho natural da evolução da consciência, da libertação dos anseios personais, apenas ainda não tomou consciência disto, apenas ainda não têm consciência de si próprio - o tal auto-conhecimento.

Eu visualizo nas religiões esta premissa. Infelizmente, o lado personal do homem distorce esta finalidade maior, para utilizá-las como mecanismo de controle, como mecanismo de manutenção e perpetuação do/no poder.
Ao invés de auxiliarmos uns aos outros, rumo à tomada de consciência maior, sobrepõem-se anseios e desejos, de uns sobre os outros, sob o pretexto da salvação, da redenção...

05 outubro 2009

A vontade de cada um

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Recebi outro dia, email sobre um tal curso de "escutatória", referia à incapacidade que a maioria das pessoas têm de dedicar-se ao que outras pessoas estão falando, de estarem na verdade apenas aguardando o fim do diálogo para expor o SEU ponto de vista - que sempre é muito mais importante.

No dia que escrevo estas linhas, após participar de reunião no meu grupo de meditação, novamente observei a necessidade que as pessoas têm de falarem de si mesmas, do que gostam, do que preferem, do que acham certo ou errado...
Em barzinhos, em conversa nas rodas de amigos, observo, a situação repete, é uma constante: a necessidade de expor o que acha, o que pensa, de ser o centro das atenções, etc. etc..

Parece que não importa o que as outras pessoas acham. Só o que EU acho importa, tem relevância, e por isso eu PRECISO que todos parem o que estão fazendo, para ME ouvir, tudo o que tenho de importante para falar. Não ouve-se o próximo, apenas aguarda-se que este conclua seu falatório, para que EU possa retomar a dissertar a MINHA opinião irrefutável.
No máximo, acontece uma troca de opiniões: o outro fala, entende-se e assimila, mas só há satisfação plena se, em reciprocidade, a opinião pessoal for explicitada, evidenciada.
Fica difícil ouvir a posição alheia, aceitar - não necessariamente concordar - e pronto?

Mas... por outro lado, se não for pela exposição do que achamos do mundo, da vida, das pessoas, ou como entendemos que universo acontece, sobre o que iremos conversar? Como fazer para nos tornarmos conhecidos para os outros, para saberem qual é a nossa postura individual, diante da miríade de opções que a vida oferece? E por que há esta necessidade?

Pra que importa?
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04 outubro 2009

Ponto de Vista

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Sempre que uma opinião é colocada, um ponto de vista, compartilhado, há um discreto regozijar egóico, pois, por um breve momento da existência, seremos o centro das atenções do mundo próximo, que irá parar para nos escutar. Esta sensação é sutil, quase imperceptível, mas infla-se rapidamente, e pode permear todo o campo de consciência, tal como tinta no tecido branco.

A necessidade, neste momento, é conseguir filtrar qualquer devaneio personal, para expressar o que se quer, sem embebedar-se no orgulho e vaidade. Pois não há como interagir com o mundo "externo" que está do lado de fora de nossa consciência, sem que seja através da personalidade, ela é a interface entre a consciência, dentro de cada um, com o mundo.

Então, a proposta passa a ser observar quem está se expressando, se é a consciência, alheia ao resultado de qualquer manifestação, ou o ego, que alimenta-se do feedback ilusório de poder que a atenção do mundo produz...

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03 outubro 2009

Ímpetos compartilhados

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Pessoas mais idosas costumam não ter tanta familiariedade com as novas tecnologias quanto àquelas que já nasceram num mundo diferente, já mudado, onde os novos equipamentos "sempre existiram". Vivenciei isto com o surgimento do VideoCassete, era sempre eu quem tinha que ir programar o dito-cujo para gravar em horário programado, com meus sobrinhos, e o nascimento do CD, e recentemente, do DVD.

Minha mãe, que usava o computador para digitar textos no Word e jogar paciência, desenvolveu recentemente uma urgência de aprender a mandar e receber emails e navegar na internet, fazer pesquisas, etc. Até ganhou um notebook - simples, sem muitas pretensões - e sempre que vou visitá-la, à noite, está ocupada, desvendando os mistérios digitais revelados a cada clique, naquela tela de cristal líquido. Até conseguiu conversar, com áudio e vídeo, com meu irmão!!

Ainda que ela sempre tenha tido interesse em ingressar neste novo universo informático (já lhe criei umas quatro contas de email, desde o ano 2000), a preemência da necessidade me intrigou... Eis então que descobri uma amiga dela, com quem convive diariamente, que já estava manuseando emails com a mesma naturalidade que usa um... microondas?

Provavelmente a influência, os comentários e sugestões da amiga foram catalizadores da vontade de aprender, um exemplo que revela não ser difícil utilizar um computador, um incentivo a participar desta nova brincadeira, usar este novo brinquedo.

Ampliando a questão da influência que os (alguns?) amigos e parentes exercem sobre nossa força de vontade, curiosidade e ímpeto, meu pai, volta e meia, aparece com algum novo alimento, pois alguém, na empresa, lhe mostra os benefícios para a saúde. Comigo também foi assim, três amigos do primário, com quem tenho muita afinidade e convivo até hoje, ao longo da adolescência - e da minha formação cultural e de caráter - compartilhavam novos livros, quadrinhos, revistas, filmes, jogos de videogame e de computador, sites, cursos, lazer (paintball, boardgames, ou baixar e arquivar TODOS os MP3 que têm da internet...), e colaboraram de forma inquestionável para a lapidação de minha personalidade, hoje.

Nesta realidade cada vez mais interligada, onde todos estão a um clique no celular ou no computador, assuntos afins alastram-se instantaneamente, dentro do círculo social e de amizades. Taí o Marketing Viral, para comprovar a eficácia da "indicação". Equanto isto, minha mãe está lá, jogando Solitaire, aguardando a resposta de um email que enviou...

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02 outubro 2009

O Não-Julgar

Final de semana com atividades na Comunidade, novos ensinamentos e o reiterar de saberes à tempos compartilhados:

O julgamento, ou avaliação crítica (do outro ou de si próprio), é frequentemente apontado como um dos fatores que mais interferem no processo de superação do ego, da personalidade.

Para avaliar uma ação, uma atitude ou comportamento, estabelecer um juízo de valor, e formatar como uma opinião - mesmo que não-compartilhada - é preciso posicionar-se dentro de algum critério. E a escolha do critério, qualquer que seja, necessita da autro-aprovação interna, precisa ser coerente com as estruturas de valores tidos como "corretos" - e, naturalmente, egóicos.
O que está fora deste círculo de valores  é definido então como incorreto, incoerente, fútil, errado, etc.

É dito que a adequada conduta do asceta compreende o não julgar, não condenar o comportamento alheio, seja este qual for. Cada ser está vivendo as experiências dentro dos valores alcançados até então, e não existe ninguém igual a outro, cada um é um dentro da miríade de possibilidades, único. Não há parâmetros suficientes para comparar...

Posicionar-se como observador apenas, respeitando o estágio de desenvolvimento do outro, seria o limite para uma interatividade social fraterna.

E nem justifica querer ensinar, mostrar, exemplificar, teimar e reclamar, porque o no caminho do auto-conhecimento, a sabedoria só alcança a essência do ser por uma porta, que só pode ser aberta por dentro de cada um.

01 outubro 2009

Epifania


Epifania é aquela sensação fantástica de um lampejo de sabedoria, nos quadrinhos é geralmente ilustrado por uma lâmpada que acente-se logo acima da cabeça.

Em época de sustentabilidade, preocupação com consumo consciente, podemos substituir a lâmpada por um LED... a epifania não será tão "luminosa", mas em compensação, pode-se efetivar várias epifanias ao longo do dia...

E estes pequenos momentos súbitos, onde acessa-se o plano das idéias e as transpõem para cá, no plano da ação, é extremamente desejável, durante a concepção de um projeto arquitetônico, p.ex., quando vai-se tecendo uma colcha de retalhos epifânicos cristalizados nas soluções pontuais...

A epifania também pode ser interpretada como um momento de iluminação, um vislumbre do Nirvana, uma rápida visita aos páramos celestiais.